Oi,
Meus 15 anos se transformaram em 21 – idade terrena. Agora
era outra caminhada, outra vida. Recebi ordens para seguir em frente. Saí na
madrugada, a caminho de novas experiências. Dei sumiço na maleta, levei só a bolsa.
No meu iPod tocava isto:
Como sempre, eu ia sem saber para onde. Andava ao léu,
ouvindo a música, cantando junto. Afinal, esse é meu destino aqui na Terra, ir
para onde mandam. Não tenho lugar fixo, sou andarilha. A madrugada estava fria
e eu usava um casaco com capuz e mantinha as mãos nos bolsos. Sozinha pela rua
praticamente deserta, eu seguia caminhando e aguardando alguma ordem ou sinal
de que eu deveria parar.
Eu nunca sabia o destino, mas acertava direitinho o caminho,
mesmo sem saber. Fui instruída a ir para o metrô e lá conheci uma turma. Eram
animados, conversadores.
O metrô ainda estava fechado, pois eram aproximadamente
quatro horas da manhã quando cheguei. Eu os vi caminhando para algum lugar,
carregando seus skates. Era véspera da Natal, ou melhor, já era dia 25 de
Dezembro.
Eles me viram ali, observando-os e um deles perguntou se eu
estava indo para algum lugar ou se tinha algo pra fazer. Respondi que não ia
fazer nada e então eles me chamaram para juntar-me a eles.
Mais tarde, tomando um refrigerante e conversando melhor,
descobri que moravam em uma república mista de estudantes. Providenciei nova
maleta vazia – busquei dizendo que estava “logo
ali adiante” e fui junto com eles. Arrumaram uma vaga para mim na república
e eu estava novamente estabelecida. Foi com esta turma que eu ganhei o apelido
de “Etnóia, a Noiada”...
Obviamente também não acreditaram que eu sou uma ET - como é
difícil ser uma ET aqui na Terra. Não sei por qual razão eles querem tanto que
eu diga a verdade... Já está claro que ninguém vai acreditar nisto. Acho que é
para verem as reações das pessoas. O meu pessoal vai estabelecer contato e
estão estudando e catalogando reações.
Esse pessoal da Terra não acredita em nada.
Eu estou bem longe da casa do João e da Glória, mas quando
quero vê-los olho na palma da minha mãe esquerda e os vejo. Antes de ir embora
eu clonei um iPod pra mim e deixei o deles lá. Claro que clonei as músicas
também.
O pessoal da Terra não acredita em mim porque não mostro a
eles nada dessas coisas que eu posso fazer. Então, sem revelar as minhas
capacidades, eu pareço uma pessoa comum, normal. Ora, como vão acreditar que
sou uma ET? Não dá mesmo.
O Etnóia pegou... Tiraram muito sarro de mim. Sabe como é
universitário, ainda mais morador de república. Ah!!! Eles riam das minhas
histórias e diziam: “Você é muito doida!”
Gostavam das histórias, mas não acreditavam em nada. Não sei
por que o ser humano é assim. Os humanos veem discos voadores (é assim que vocês
chamam as vimanas), são abduzidos e.... Mesmo assim, ninguém acredita.
Um deles disse o seguinte pra mim, certa vez:
“Ah! Esse negócio de
disco voador, de ET, é papo furado.... Se vocês são tão inteligentes,
adiantados, poderosos, capazes de vir aqui... Por que não se mostram logo? Por
que não descem a nave espacial na frente de todo mundo, dizem o que querem e
pronto? Mas não... Ficam aí ensebando... Por que? Porque é mentira, isso não
existe. Você até que tem cara de ET, nome de ET... Nunca vi ninguém chamado
assim, mas quem prova que você é uma ET mesmo? Nem você prova! Ah, me poupa!”
A risada foi geral.
Com meus novos amigos, enquanto morei na república, aprendi
a andar de skate, de bicicleta, de patins. Gostei muito. Fiquei fã de
sanduíches, de tanto comer com eles em lanchonetes, padarias, carrinhos,
vans... Enfim, onde havia alguém vendendo sanduíches e batatas, lá estávamos.
A vida na Terra, depois do orfanato, ficou bem melhor. A
vida de criança não foi boa pra mim, não. Não foi legal. Ninguém me adotou, iam
lá ao orfanato, olhavam pra mim e me achavam feia, esquisita, uma criança...
Sei lá, estanha. Então fiquei por lá até a hora de ir embora. Não se adota
muito por aqui pela Terra, não. Apenas uma criança ou outra que tem a sorte de
ser adotada. Eu não tive essa sorte. A maioria das crianças dos orfanatos
cresce sofrendo e acaba na rua.
A minha vida com o João e a Glória foi uma boa mostra de
como ser jovem: cinema, pipoca, sair com os amigos ouvir música... Eu gostei
daquele tempo e realmente tenho aprendido um bocado nestes lugares por onde
passo. Morar em uma casa de terráqueos, vivenciar a rotina da família, seus
hábitos, suas comidas. Foi um aprendizado, apesar do pouco tempo. Eu sinto
falta deles e fico imaginando como se sentiram quando encontraram a carta de
despedida que deixei pra eles.
Não posso mais voltar lá... Não somos sentimentais, porém
acho que com todo esse tempo vivendo neste planeta acabei desenvolvendo esses
sentimentos... Ando bem humana, já.
Beijos.